Dioxinas I

DIOXINAS

HISTÓRICO

O fabrico intenso de compostos organoclorados que se verificou a partir da década de 40, aliado à sua grande estabilidade biológica e molecular, tem causado, progressivamente, problemas ambientais uma vez que os compostos deste tipo, por regra bastante tóxicos, têm se acumulado na natureza de forma preocupante.

Além disso, o esforço humano em reduzir a acumulação dos compostos acima referidos conduz, por vezes, à produção de compostos de toxicidade ainda mais elevada como são as dibenzo-para-dioxinas policloradas, correntemente designadas por dioxinas (PCDDs - "PolyChlorinated DibenzoDioxins"). Embora ainda não sejam totalmente conhecidos todos os efeitos das dioxinas nem estejam explicados todos os mecanismos pelos quais elas atuam já se encontram definitivamente estabelecidos alguns aspectos toxicológicos que permitem classificá-las como das substâncias mais tóxicas conhecidas.

Esses compostos originalmente nunca foram produzidos industrialmente com um objetivo concreto, mas resultam, como produtos indesejáveis, de reações secundárias em diversos processos industriais das indústrias química, do papel e da celulose, metalúrgicas (e particularmente, siderúrgicas), de desengorduramento de metais e de fabrico de materiais poliméricos.

Contudo, outra fonte particularmente importante destes compostos reside nos processos de combustão que ocorrem em incineradores, de resíduos urbanos, hospitalares ou industriais, quer de plásticos e de lamas de depuração de tratamento de águas e efluentes líquidos, particularmente no caso em que os teores em compostos clorados sejam significativos.

 

CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E QUÍMICAS DAS DIOXINAS E DIBENZOFURANOS

A primeira dioxina clorada foi sintetizada em 1872 por Merz e Weith, mas a estrutura do composto só ficou completamente esclarecida em 1957.

A primeira síntese de TCDD também foi efetuada em 1957, tendo-se verificado que, em ambos os casos, os técnicos de laboratório envolvidos nos trabalhos foram hospitalizados com sintomas de intoxicação. Os derivados clorados das dibenzo-para-dioxinas são compostos orgânicos com analogias estruturais com os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (PAHs). Os átomos de hidrogénio das posições 1 a 8 podem ser todos substituídos por átomos de cloro, havendo assim um total de 75 possibilidades de ocorrência de derivados clorados diferentes, de entre os quais a 2, 3, 7, 8 - tetraclorodibenzo-p-dioxina (2, 3, 7, 8 - PCDD ou TCDD), é o que apresenta o maior grau de toxicidade.

A investigação sistemática destes compostos efetuada a partir de 1976 revelou aspectos da elevada toxicidade das dioxinas e, em particular, que a TCDD é declaradamente a substância cancerígena mais potente, em termos de organismos humanos, alguma vez avaliados pela USEPA, a Agência de Proteção Ambiental Americana. Isto significa que mesmo a exposição a quantidades extraordinariamente diminutas deste composto pode provocar efeitos, na saúde, muito sérios e irreversíveis. Diversos estudos toxicológicos em roedores, peixes e macacos têm vindo a demonstrar que a exposição à TCDD tem efeitos carcinogênicos, reduz as defesas imunológicas e a fertilidade.

Apesar da quase total inexistência de estudos em humanos, por razões compreensíveis, reconhece-se que a persistência de TCDD no organismo é elevada, sendo estimada a sua meia-vida no organismo em cerca de 7 anos. Até agora, os efeitos observáveis em indivíduos expostos a dioxinas têm estado associados à síndromas não letais como o aparecimento de cloroacne, a ativação de algumas enzimas (tais como os da família dos citocromos P450) e a possível redução da contagem de espermatozóides, bem como alterações do sistema imunológico e da velocidade de coagulação do sangue. A exposição dos seres humanos a altos níveis de concentração de dioxinas ocorrida durante os graves acidentes industriais anteriormente referidos resultou, em primeiro lugar em afecções tais como cloroacne e doenças do fígado. Estudos epidemiológicos efetuados sobre as populações expostas e publicados depois desta data estabelecem definitivamente que as dioxinas são promotor/carcinogênicos como já havia sido demonstrado em animais. Os indícios existentes relativos à elevada toxicidade são mais do que suficientes para impor a identificação das fontes de dioxinas e reduzir as emissões para o ambiente, evitando assim contaminações através da cadeia alimentar que é uma das principais fontes próximas de contaminação do homem.

 

PRINCIPAIS FONTES EMISSORAS DE DIOXINAS E DIBENZOFURANOS PARA A ATMOSFERA

Historicamente, as fontes emissoras de dioxinas e dibenzofuranos classificam-se em três categorias principais:

a) Industriais:

- processos da indústria química

- processos da indústria de celulose e papel

- processos metalúrgicos e siderúrgicos

- desengorduramento de metais

- fabrico de retardantes de chama contendo bromo e/ou cloro

b) Processos de combustão

b.1) Fontes estacionárias :

- incineradoras de resíduos municipais

- incineradoras de resíduos tóxicos e perigosos

- incineradoras de resíduos hospitalares

- combustão de lamas de depuração de ETARs

- processos de reciclagem de metais

b.2) fontes móveis :

- exaustão de gases de veículos automóveis

- incêndios florestais e incêndios controlados em atividades agrícolas

- fumo de cigarros

b.3) fontes acidentais :

- combustão de policlorobifenilos (PCB), PVC, incêndios envolvendo outros materiais plásticos, etc.

c) Fontes secundárias:

- exaustão de gases provenientes de aterros e áreas contaminadas

- aplicações decorrentes da utilização de lamas de depuração de Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR)

 

TEORES DE DIOXINAS E DIBENZOFURANOS NO MEIO AMBIENTE

As dioxinas e dibenzofuranos emitidos a partir dos processos de combustão são transportadas através da atmosfera, depositando-se nos oceanos, lagos e no próprio solo. Devido à sua deposição no meio aquático e à sua baixa solubilidade em água, estes compostos vão ficando acumulados nos sedimentos.

 

IMPACTO DAS DIOXINAS E DIBENZOFURANOS SOBRE OS SERES HUMANOS

Apesar da quase total inexistência de estudos em humanos, por razões compreensíveis, reconhece-se que a persistência de TCDD no organismo é elevada, sendo estimada a sua meia-vida no organismo em cerca de 7 anos. Até agora, os efeitos observáveis em indivíduos expostos a dioxinas têm estado associados a síndromes não letais como o aparecimento de cloroacne, a ativação de algumas enzimas (tais como os da família dos citocromos P450) e a possível redução da contagem de espermatozoides, bem como alterações do sistema imunológico e da velocidade de coagulação do sangue. A exposição dos seres humanos a altos níveis de concentração de dioxinas ocorrida durante os graves acidentes industriais resultou, em primeiro lugar em afecções tais como cloroacne e doenças do fígado.

Estudos epidemiológicos efetuados sobre as populações expostas e publicados depois de 1976 estabelecem definitivamente que as dioxinas são promotores/carcinogênicos como já havia sido demonstrado em animais. Os indícios existentes relativos à elevada toxicidade são mais do que suficientes para impor a identificação das fontes de dioxinas e reduzir as emissões para o ambiente, evitando assim contaminações através da cadeia alimentar que é uma das principais fontes próximas de contaminação do homem.

Nos países mais industrializados do Norte da Europa (Alemanha, Reino Unido, Holanda) os níveis de dioxinas encontrados em seres humanos começam a estar perigosamente próximos da dose que se estima ser capaz de produzir os primeiros sintomas de toxicidade em seres humanos e animais. Os efeitos sobre seres humanos expostos a doses baixas de dioxinas e dibenzofuranos incluem alterações do seguinte tipo: imunossupressão, com conseqüente diminuição das defesas do organismo contra agentes patogênicos vindos do exterior; doença hepática, com aumento de volume do fígado e acumulação intracelular de gordura (com possível evolução para cirrose hepática); possível redução da contagem de espermatozóides viáveis, o que poderia explicar parcialmente a diminuição acentuada, nos últimos 50 anos, dos níveis de fertilidade; indução enzimática das enzimas hepáticas de destoxificação (família dos citocromos P450); alterações da coagulação sanguínea. Na Holanda foram detectados casos de derrame sanguíneo cerebral em recém-nascidos, que foram associados a exposições a doses medianamente elevadas de dioxinas contidas no leite materno [16]. Estes derrames podem estar associados a uma deficiência em vitamina K (lipossolúvel), que pode aparecer quando há lesão das células do fígado, e uma redução conseqüente da quantidade de ácidos biliares incluídos na bílis. Esta redução origina uma má absorção de compostos lipossolúveis por deficiente emulsão das gorduras no duodeno, que terá afetado negativamente a absorção de vitamina K, resultando nos derrames descritos.

O consumo de peixe por populações humanas, em zonas costeiras do Mar Báltico, foi também associado aos primeiros sintomas de exposição a dioxinas em doses medianamente elevadas. As dioxinas estariam neste caso contidas na gordura do peixe, sendo este um bom exemplo da contaminação através da cadeia alimentar. A entrada destes contaminantes no corpo humano faz-se principalmente por via indireta, através da cadeia alimentar, sendo menos importante a via de contato direto com a pele e a via respiratória. Os produtos animais contêm apenas um determinado número de isómeros tóxicos mais estáveis, e diversos estudos demonstram que uma importante percentagem das dioxinas e dibenzofuranos, procedentes de sedimentos e cinzas volantes, penetram na cadeia trófica por bioacumulação em organismos aquáticos.

Uma vez o contaminante presente no corpo humano tende a acumular-se em diversas zonas com elevado teor em gordura, tais como o tecido adiposo e o leite materno. Em 1989 efetuaram-se diversas análises de leite humano, em que foi detectada a presença de PCDD e PCDF.

Os níveis encontrados indicam que não há diferenças entre zonas industrializadas e outras. Mais de 50% das dioxinas encontradas são do tipo octaclorodibenzo-p-dioxina, em gamas de concentração entre 200 e 2000 pg/g de gordura. Uma conclusão importante destes estudos é a de que a concentração de PCDD e PCDF no leite materno decresce à medida que aumenta o número de filhos que tenham sido amamentados pelas suas mães, o que indica que a amamentação é uma via importante de transferência das dioxinas da mãe para o filho.

Além disso, tem-se verificado, por meio de estudos cinéticos, que os isómeros mais lipofílicos são os que se eliminam mais rapidamente através do leite materno. Vartiainen e Liimatainen demonstraram que as dioxinas e dibenzofuranos são cancerígenas no Homem (cerca de 20 anos após a exposição), como, aliás, já tinha sido demonstrado em animais, embora os mecanismos concretos da geração de tumores não estejam ainda completamente esclarecidos. Os "efeitos letais" da exposição teriam assim um período de incubação de cerca de 20 anos, o que explica a dificuldade, encontrada até 1991, em estabelecer um nexo de causalidade entre exposição a dioxinas - tanto no caso de acidentes graves (exposição a doses altas em curto período de tempo) como nos casos de trabalhadores expostos a doses mais baixas por períodos consideráveis - e o aparecimento de cancro no Homem.